25.6.20

Resenha: Razão e Sensibilidade - Jane Austen


A HISTÓRIA

Elinor e Marianne Dashwood são irmãs completamente diferentes. Elinor é ponderada e calma enquanto a mais jovem Marianne é atrevida e energética. Elas possuem boa educação e um círculo privilegiado, mas estão longe de serem ricas. Após a morte do pai, Elinor e Marianne precisam se mudar juntamente com a mãe e a irmã caçula para uma casa na propriedade de Sir John Middleton, um parente distante. 

O novo lar pode ser mais modesto, mas as Dashwood se tornam a sensação local do momento. Sir John as apresentam a vários de seus amigos e parentes. Elinor, contudo, ainda tem sua mente fixada no breve encontro com Edward Ferrars, o irmão de sua cunhada. Um homem reservado, mas amável, Edward parece o par perfeito para Elinor e a mãe dela até espera que eles se casem. Contudo, sem uma profissão, Edward depende da herança da sua mãe, que já deixou bem claro que espera que ele se case com uma mulher da alta sociedade.

Para Marianne, homens como Edward Ferrars são bastante insossos. Do alto de seus dezessete anos, a garota apaixonada por música quer viver uma paixão arrebatadora por um homem interessante. Assim, quando torce o tornozelo em uma caminhada e o belo e rico John Willoughby a carrega em seus próprios braços de volta para casa, Marianne se apaixona perdidamente. E não esconde isso de ninguém. Ela e Willoughby tem temperamentos parecidos, ambos são rápidos em fazer piadas e apaixonados por suas próprias opiniões.

A mãe das Dashwood espera que a amizade de sua filha vire casamento. Contudo, ela própria imagina que, para Marianne, um par mais adequado fosse alguém como Coronel Brandon, amigo de Sir John. Na maturidade de seus 35 anos, Brandon se apaixona pela vivacidade de Marianne, não sendo correspondido pela moça, que o acha velho demais para elas. Contudo, será que há final feliz entre Marianne e Willoughby? E será que Elinor e Edward encontrarão uma forma de estarem juntos de novo?

O LIVRO E A NARRATIVA

Primeiro livro publicado de Jane Austen, Razão e Sensibilidade foi lançado originalmente em 3 volumes em 1811 sob o pseudônimo "A Lady". Ele começou a ser escrito quando Austen tinha apenas 19 anos e, ao se comparar o que foi originalmente a parte 1 com a parte 2 (que tem capítulos mais longos e conflitos mais elaborados), é perceptível que a autora foi se aprimorando enquanto escrevia a obra.

Os diálogos também crescem e se aprofundam com o andar no livro. No início, os personagens dizem muito pouco e cabe ao narrador em terceira pessoa nos explicar o que se passou, o que deixa a leitura mais lenta. Mas, para o final, Austen começa a deixar seus personagens se mostrarem por si só, com confissões, declarações e opiniões próprias apaixonadas e longas. Assim, a narrativa fica um pouco mais dinâmica e nos prende com mais facilidade.

Em Razão e Sensibilidade já se vê algumas características que se tornariam a marca de Austen em seus próximos trabalhos. Seu humor tipicamente inglês, irônico e crítico, é mais sutil nesse livro, mas igualmente afiado. Inclusive, as reações emocionais exageradas que seus personagens têm (correndo para fora da sala e chorando por dias, por exemplo) são até um pouquinho cômicas e alguns autores argumentam que seriam uma forma de paródia por parte de Austen.

No fim, como o próprio livro, a narrativa de Razão e Sensibilidade não é uniforme. Contudo, as mudanças são bem-vindas, já que partem do amadurecimento da autora, que começa mais sucinta, simplista e lenta, para se tornar mais complexa, dinâmica e cativante.


A TRAMA E AS LIÇÕES DO LIVRO

Um dos maiores méritos de Jane Austen é conseguir tirar de histórias de pessoas comuns ensinamentos sobre a alma e a sociedade humana. A primeira vista, Razão e Sensibilidade é um livro sobre os desfortúnios amorosos de duas irmãs bem educadas, mas pobres. E é muito gostoso acompanhar o desenrolar de seus dramas amorosos, mesmo que, particularmente, não os achei tão interessantes quando os de Orgulho e Preconceito (o outro único livro que li da autora e, até agora, meu favorito).


As idas e vindas de Elinor e Marianne com suas paixões são cheias de surpresas e reviravoltas, mas pouco cativantes, porque soaram, para mim, um pouco excessivamente dramáticas. De fato, nenhum dos casais do livro me conquistou, por isso Razão e Sensibilidade sequer chega a ser um romance romântico na minha opinião. Para mim, a obra é mais sobre o amor de duas irmãs, que aprendem a se aceitar e se apoiar, assim como a compreender as diferenças entre elas de forma mais empática.

Elinor é o retrato do recato, gentileza e calma. Ela encara todos com bondade e a paciência de uma santa, o que pode ser lido como frieza. Marianne, como qualquer garota de 17 anos, é atrevida e apaixonada pela vida, mas inconsequente. E juntas, as irmãs crescem e aprendem a maior lição do livro para mim: mais do que batalhar para ver o que vence, a razão ou a emoção, é melhor se nos ponderarmos entre as duas. Afinal, na vida, há momentos para ser racional e há momentos para nos deixarmos ser emocionados.

Contudo, crítica como Austen é, ela não traz só mensagens bonitas de aceitação. A autora claramente expõe a hipocrisia das ditas boas famílias de seu tempo e classe. Apesar de se posarem como muito civilizados e gentis, os personagens do livro estão o tempo todo fazendo fofocas e especulando sobre a vida alheia. Eles também julgam uns aos outros severamente pela aparência e modos e, especialmente, o dinheiro. 

Eu gosto de como Austen é realista e mostra que nenhum casal vive só de amor, mas ela também expõe como os seres humanos são ambiciosos e colocam, muitas vezes, os próprios sentimentos depois dos interesses financeiros. Os personagens estão o tempo todo falando sobre renda, ganhas e perdas. Razão e Sensibilidade mostra como, de fato, muitos casamentos da época aconteciam por simples interesse financeiro. 

Uma parte muito irônica, ainda mais para os dias de hoje, é como, apesar de se importarem tanto com dinheiro, os personagens não trabalham. É até engraçado como Edward reclama que a família nunca o “deixou” escolher uma profissão para si, um registro claro de como na época de fato a classe alta inglesa via o trabalho como indigno da sua posição, apesar de que o dinheiro era sempre o centro de suas conversas e motivo de suas interações.

Entretanto, é preciso pontuar que, apesar de temáticas tão interessantes, a trama de Razão e Sensibilidade não é das mais emocionantes ou particularmente marcante. O ritmo do livro é bastante lento.

OS PERSONAGENS

Infelizmente, os personagens de Razão e Sensibilidade também deixaram a desejar para mim. Primeiro de tudo, me incomoda como Austen (assim como fez em Orgulho e Preconceito) sempre coloca seus protagonistas acima dos outros personagens. Mesmo que tenham defeitos e cometam erros, seus mocinhos e mocinhas são sempre recuperáveis e desculpáveis, enquanto os personagens secundários são sempre rudes, insossos, interesseiros e defeituosos, quase como se não fosse humanos também.

Além da pouquíssima empatia dos protagonistas de Razão e Sensibilidade, também os falta personalidades muito marcantes. Especialmente os heróis, que estão longe de serem heroicos ou sequer românticos. Eu sempre amarei Austen por ter dado voz aos mocinhos tímidos e genuinamente gentis, mas enquanto Darcy, por exemplo, é arrebatador com sua estranheza social, Edward e Brandon são entediantes e pouco corajosos. Assim, por comparação, Willoughby, com sua confiança e opiniões fortes soa bem atrativo a princípio, mas logo descobrimos que sua arrogância e hipocrisia o tornam a definição de um homem tóxico.


A EDIÇÃO

A bela edição que tenho traz três obras de Austen: Razão e Sensibilidade, Orgulho e Preconceito e Persuasão. Gosto bastante dos detalhes em dourado da capa dura e as ilustrações no início de cada obra. A diagramação é simples, com boas páginas cor de creme, mas uma fonte pequena. A tradução também deixou a desejar em alguns momentos, com termos estranhos que mereciam uma explicação de rodapé. Ainda há o fato de que essa edição é bastante pesada, o que torna a leitura um pouco desconfortável.

VALE A PENA LER?

Razão e Sensibilidade não conseguiu desbancar Orgulho e Preconceito como meu favorito de Jane Austen, mas é uma leitura essencial para compreender a trajetória da escritora. Seu primeiro romance longo, as páginas registram o amadurecimento da escrita de Austen, já que a cada página que se passa ele se torna mais complexo e melhor desenvolvido. Aqui, vemos os primórdios da marca registrada de Austen: dramas amorosos complicados, recheados de crítica bem-humorada, mas ácida, sobre a hipocrisia e excessos da classe alta inglesa do início do século 19.

Como romance, Razão e Sensibilidade não é muito impactante ou emocionante, apesar de ter umas boas reviravoltas. Os personagens, especialmente os mocinhos, são bastante insossos e julgadores demais para o meu gosto. Razão e Sensibilidade foi uma experiência interessante, mas que não pretendo repetir tão cedo. Falta ao livro algo ou alguém que cative melhor o leitor. Ainda assim, é um clássico que vale a pena ser lido.


Título: Razão e Sensibilidade (a edição contém também Orgulho e Preconceito e Persuasão)
Título original: Sense and Sensibility
Autora: Jane Austen
Editora: Martin Claret
ISBN: 9788544000847
Ano: 2015
Páginas: 233 (640 toda a edição)
Encontre o livro: Skoob - Goodreads
Compre: Amazon

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1 comentários:

  1. Estou na metade e, até o momento, minha visão sobre o livro não está caminhando muito longe da sua. Porém gostei da Elinor.

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