30.8.18

Resenha: Onde a Luz Cai - Allison Pataki e Owen Pataki


A HISTÓRIA

Em 1792, Paris vive uma revolução como jamais foi vista. Três anos antes, a queda da Bastilha deu início a uma caça pelos nobres, ricos e opressores do povo. O rei foi tirado do trono e, agora, sob o lema de Liberdade, Igualdade e Fraternidade, o povo francês vive novos tempos… Tempos de terror. A guilhotina é a principal arma e grande atração do país, que tenta estabelecer uma nova ordem cortando as cabeças e perseguindo inimigos, os defensores da antiga monarquia. É nesse tempo sombrio que a vida de dois jovens casais, Jean-Luc e Marie, e André e Sophie, se cruzam.

“Tome cuidado para não permitir que as músicas e as poesias o seduzam – esses homens cantam a ‘Marseillaise’ com um espírito admirável e, no entanto, eu me pergunto se já viram o que uma salva de tiros pode fazer com um homem. A batalha não é glamourosa, nem bonita.” pág. 45

Jean-Luc é um jovem advogado que se mudou com a esposa, Marie, para Paris com intuito de participar da revolução. Agora, ele passa seus dias catalogando posses de nobres confiscadas pelo governo e temendo que tenham ido longe demais. Afinal, o rei foi deposto e os nobres estão sendo guilhotinados, mas o povo ainda passa fome e todos vivem amedrontados. Diferente dos seus colegas advogados, que se regojizam com o terror, Jean-Luc quer apenas ajudar a quem precisa e construir um país melhor. Será sua inteligência que o colocará no meio dos advogados mais importantes da revolução, mas é o bom coração de Jean-Luc que o transformará em inimigo de um ambicioso e cruel advogado da revolução, que sente prazer em mandar seus desafetos para a guilhotina.


André perdeu tudo para a revolução. Seu pai, um nobre, foi guilhotinado; suas terras confiscadas; e sua mãe fugiu e desapareceu na Inglaterra. Agora, André tem apenas um objetivo: manter a si mesmo e a seu irmão salvos. E a melhor opção para ambos é continuar no exército, lutando pela revolução… apesar de não acreditarem nela. Mas, André sabiamente guarda sua opinião para si e tenta apenas sobreviver as batalhas que precisa enfrentar em nome do país. Contudo, seu plano de passar despercebido vai por água abaixo quando ele conhece Sophie.

“A glória é fugaz e deve ser conquistada enquanto está diante de você. Engraçado, pensou André, ele diria o mesmo sobre o amor. Sobre a própria vida.” pág. 350

A bela e jovem viúva aristocrática Sophie, sabe que sua cabeça só não foi cortada porque seu tio é um influente comandante do exército. Mas é justamente por causa dele que ela passa seus dias no tédio, trancada em casa e distante de toda a efervescência da revolução. Apesar de ser extremamente patriótica, Sophie não tem sonhos ambiciosos de participar da construção do novo país. Ela quer apenas ser feliz. O que acontece quando ela conhece o sério charmoso André. Eles se apaixonam rapidamente, apesar de que, por causa do seu tio, que odeia André e sua família, Sophie saiba que nunca terá um futuro ao lado do amado. E é só uma questão tempo para que o romance secreto dos dois coloquem a vida de ambos em perigo.


A LEITURA

Fiquei curiosa para ler Onde a Luz Cai assim que recebi um e-mail da editora sobre o livro. Eu amo romances históricos tanto quanto os de época, apesar de não devorar tantos do primeiro tipo quanto do segundo. Eu já esperava gostar de Onde a Luz Cai, mas a obra me surpreendeu de várias maneiras. A leitura não foi tão rápida quanto eu gostaria (demorei um mês para concluí-la), mas foi emocionante e bastante educativa.

“(…) a ira do povo é a verdadeira fonte da força e do poder da nação.” pág. 105

A narrativa é, em parte, um dos motivos porque não devorei Onde a Luz Cai mais rápido. A narrativa apresentada no livro é muito boa e consistente, não dá para perceber que foi escrita por mais de uma pessoa. Contudo, ela é muito descritiva e detalhista, essencial para uma obra histórica, já que muito precisa ser explicado e quanto mais detalhes, mais nos sentimos transportados para aquele tempo. Mas, eu sempre vou preferir livros mais objetivos e, somado a seus capítulos extensos, a narrativa de Onde a Luz Cai acabou não sendo tão fluída para mim.

Entretanto, um ponto positivo é que a narrativa, sabiamente, consegue intercalar seu foco entre os personagens principais, se tornando mais dinâmica. A sinopse de Onde a Luz Cai nos intriga ao não revelar como a vida dos dois casais, Jean-Luc e Marie, e André e Sophie, vai se entrelaçar, o que deixa o começo do livro bastante intrigante. Mas, quando os quatro começam a se envolver, a trama não perde parte do seu mistério, já que ficamos nos perguntando se eles vão ter um final feliz e como vão enfrentar as muitas dificuldades que serão colocadas em seu caminho. Onde a Luz Cai, além de uma boa lição de história sobre a Revolução Francesa e ascensão de Napoleão ao poder, traz uma história com bastante drama e pitadas de ação e romance. O livro tem algumas reviravoltas surpreendentes e outras previsíveis, mas os acontecimentos têm bastante carga emocional, por isso o livro não é chato em nenhum momento.

No fim, eu resumiria Onde a Luz Cai como um envolvente drama sobre amores verdadeiros e proibidos, família, amizade, vingança e esperança que, por acaso, tem como pano de fundo um dos momentos mais marcantes da história política e social do ocidente. O livro nos mostra tudo aquilo que nos faz humanos, da nossa bondade a maldade, do amor ao ódio, sendo a nossa humanidade imutável pelo tempo e nossos instintos mais básicos de sobrevivência e proteção a quem amamos inatingíveis por qualquer revolução. Onde a Luz Cai também aborda, em segundo plano, o contexto histórico de fome, pobreza e ganância que proporcionou a Revolução Francesa e como o movimento mudou a história sem realmente mudá-la. Afinal, ele destronou uma monarquia secular que era supostamente inatingível, mas trocou-a por um imperador igualmente ambicioso e ganancioso através de muito terror e sangue, sem realmente ajudar as classes pobres e marginalizadas...


OS PERSONAGENS

O aspecto mais fascinante de Onde a Luz Cai é que a obra mistura personagens fictícios e figuras históricas reais de forma que é impossível dizer quem existiu e quem não passa de fantasia. Há vários nomes que reconhecemos logo de cara, como Napoleão, Robespierre, Luís XVI e Thomas-Alexandre Dumas (pai do autor de O Conde de Monte Cristo e Os Três Mosqueteiros). Contudo, também há vários personagens inspirados em figuras reais, mas que tiveram destinos e papéis bem diferentes na ficção – o que me frustrou um pouco, já que, para mim, quando a obra é baseada em fatos reais, tem que ser o mais verossímil possível. 

Mas, preciso elogiar Onde a Luz Cai pelo desenvolvimento de seus personagens. Os autores souberam dosar o número de figuras que povoam a história, de forma que não ficamos confusos na hora de diferenciar quem é quem. Os irmãos Pataki apostaram em uma construção mais clássica de heróis e vilões, que não é minha favorita, mas que serve bem a essa história. Os antagonistas de Onde a Luz Cai são realmente detestáveis e é fácil, e divertido, torcer para que se deem mal. Do mesmo jeito, por serem tão obviamente bonzinhos, os heróis são muito cativantes. Contudo, eles não deixam de ter personalidade complexas e humanas, com sonhos, desejos, medos e traumas como qualquer pessoa.

Nosso quarteto protagonista ganhou um lugarzinho no meu coração. Eu gosto do contraste criado entre os dois casais. Enquanto Jean-Luc e Marie vem de origem humilde e fielmente acreditam na revolução, André e Sophie foram criados de forma nobre e não querem se envolver com revolução nenhuma e sim serem apenas felizes. Contudo, ambos os casais acabam lutando pelo país de alguma forma e, claro, testemunhando todas as mudanças que estão ocorrendo.

“Isso tudo começou com mulheres que estavam fartas. Mulheres que pegaram suas facas de peixe e seus atiçadores de fogo e marcharam até Versalhes para exigir comida para suas famílias. Você acha mesmo que, se a luta chegar a Paris, vamos ficar sentadas em nossos apartamentos enquanto os homens correm para as muralhas?” pág. 67

Também há outro contraste interessante: Sophie e André vivem um relacionamento proibido e perigoso, enquanto Marie e Jean-Luc representam um amor mais familiar e caseiro, baseado em carinho e companhia, em vez da excitação e emoção do proibido, como o primeiro casal. Apesar de suas trajetórias diferentes, mesmo que entrelaçadas, eu amei e torci pelos dois casais. E só gostaria que as duas mulheres, tão inteligentes e fortes como os homens, pudessem ter tido mais aventuras só suas durante a história. Contudo, os autores fizeram questão de mostrar que as mulheres, no geral, participaram tão ativamente da Revolução Francesa quanto os homens, coisa que muitos livros de história de verdade esquecem...


A EDIÇÃO

Onde a Luz Cai tem uma boa edição. A tradução está perfeita e o texto sem erros. A diagramação é simples, sem grandes detalhes. Apesar de gostar das páginas cor de creme e fonte usada, acredito que letras com um tamanho um pouco maior deixariam a leitura mais confortável. Eu adoro a capa de Onde a Luz Cai. Ela traz uma bonita imagem, mas não clichê, de Paris, e as cores usadas combinam bem com a trama. O azul-escuro representa o mesmo ar pesado das partes mais dramáticas e tensas da história, enquanto o rosa alaranjado e o dourado do título nos remete ao romance e a amizade presente no livro.

CONCLUSÕES FINAIS

Em meio a Revolução Francesa, momento em que expressar uma opinião e amar poderia te tornar um inimigo da nação, a vida de dois casais se entrelaçam e diante o perigo eles precisam se unir para sobreviver. Uma história sobre amor, amizade, esperança, ambição e vingança, além de, claro, revolução, Onde a Luz Cai pega um dos momentos mais emocionantes da história ocidental para falar sobre o que nos torna humanos, bons e ruins. Apesar de algumas reviravoltas previsíveis, a história é emocionante e traz protagonistas cativantes pelos quais temos prazer de torcer. Onde a Luz Cai, com sua narrativa muito detalhista, é uma obra para ser apreciada devagar e, apesar da leitura mais lenta, a recomendo para todos que gostam de um bom romance histórico. O livro é uma aula sobre a Revolução Francesa e a ascensão de Napoleão com muito drama, ação e romance.

QUOTES FAVORITOS

“Em muitos lugares públicos, a imagem da cruz foi substituída pelo novo ícone sagrado da nação: a guilhotina.” pág. 17

Não seria vergonhoso, perguntou a Marie, ter nascido nessa época da História e, no entanto, recuar diante da tarefa gloriosa de um povo livre se levantando em nome da liberdade, da igualdade e da fraternidade?” pág. 21

Mas antes que pudessem construir o novo país, alguém precisava descobrir o caminho adequado para desmantelar o antigo.” pág. 22

“‘(…) Liberdade, igualdade, fraternidade...’ O homem mais velho inclinou-se para mais perto de Jean- Luc. ‘É tudo muito lindo e maravilhoso, mas a verdadeira origem desse novo poder é uma coisa bastante simples: raiva pura e desenfreada. Fúria, nascida de anos de desespero.'” pág. 106

Título: Onde a Luz Cai
Título original: Where the Light Falls
Autores: Allison Pataki e Owen Pataki
Editora: Gutenberg
ISBN: 9788582355145
Ano: 2018
Páginas: 368
*Esse exemplar foi uma cortesia da Editora Gutenberg
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1 comentários:

  1. Ótimo post, você está de parabéns. Gostei que tivesse abordado vários tópicos, assim dá para organizar a resenha e fica mais fácil para o leitor se situar. Vou tentar fazer parecido no meu blog.
    Quanto ao livro não faz muito o meu género, acho que a culpa de não gostar muito de obras sobre a revolução francesa é do livro "A Educação Sentimental" de Gustave Flaubert, toda a gente diz que é um dos romances mais influentes do século XIX, mas para mim foi uma tortura, levei meses para concluir a leitura e só não desisti porque sou teimosa e pelo livro ser claramente uma sátira à sociedade francesa da época.
    Mundo da Fantasia

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