28.6.18

Resenha: A Lucidez da Lenda - Raul de Taunay

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A HISTÓRIA

Apesar de ser 2050, Antônia dos Anjos vive uma rotina pacata em São Bento da Ribanceira, cidade amazonense. A floresta foi o seu quintal e a jovem é uma pessoa tranquila, uma devota que acredita na paz, no amor e no diálogo para resolver conflitos. Jack Stealler, também chamado de Gorila, é um poderoso magnata americano. Para ele, o mundo é movido por duas coisas: dinheiro e violência. Mas, o capitalista não está satisfeito em apenas controlar a Federação das Corporações Unidas, uma aliança corporativa que acabou tomando o poder do antigo Estados Unidos e de demais países de primeiro mundo. Gorila quer expandir seu poder para o sul e tomar uma das poucas riquezas que ainda não o pertencem: a Amazônia. E ele não deixará qualquer se colocar entre o seu caminho.

“A paz não era boa. O mundo precisava voltar a temer algum inimigo comum, inventado ou não, para demandar novamente produtos e serviços de sua Corporação.” pág. 30

Gorila, utilizando-se do dinheiro e da ambição, logo forma aliados para seu plano de dominação: um assassino de aluguel, um prefeito corrupto e até mesmo um ambientalista ganancioso. Stealler já tem todo um plano em mente para desestabilizar a paz na região amazônica e roubá-la do governo brasileiro, fazendo todo o processo soar o mais legítimo possível. Contudo, Gorila não sabe que seu plano perverso é bem conhecido por Antônia. Sob diversas formas, um ser superior começa a se comunicar com a jovem e lhe dá uma missão. Mas, para salvar a floresta, o seu lar e todo o seu país, Antônia precisará deixar a sua vida pacata para trás e se colocar na linha de frente dessa batalha. A garota se une a um jovem jornalista, um grupo de hackers e até mesmo sobreviventes de uma tribo indígena massacrada para impedir que a nossa floresta seja tomada para sempre.

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A LEITURA: TRAMA E CRÍTICAS DO LIVRO

Eu estava curiosa para ler A Lucidez da Lenda. As distopias nacionais sempre parecem ofuscadas pelas lá de fora, e, muitas vezes, seguem o mesmo modelo das internacionais. Esse livro, entretanto, se propõe a fazer diferente. A Lucidez da Lenda não nega sua nacionalidade, ambientando grande parte da sua história no Brasil, em um cenário não tão comum assim: a Amazônia. Raul de Taunay ainda transporta vários elementos da nossa cultura para a trama, fazendo referências a figuras históricas e mitológicas nacionais, em especial de religiões católicas e indígenas. De fato, a espiritualidade é um traço forte de A Lucidez da Lenda, algo incomum em distopias e que, apesar de ter me causado certo estranhamento, já que não sou uma pessoa muito religiosa, acabou sendo parte essencial da trama.

E falando da história, A Lucidez da Lenda foge um pouco dos clichês para livros do seu gênero. É muito interesse e real o futuro que o autor delineia, descrevendo tecnologias fascinantes e bem próximas das que já existem. O autor também precisa ser elogiado por construir uma história tão bem amarrada. No início, tive a impressão de que muito do que estava acontecendo era completamente desnecessário de ser contado, mas, no final, todos os acontecimentos se encaixam perfeitamente no e se provam essenciais para a trama como um todo. Mas, além disso, Raul de Taunay constrói um cenário sociopolítico-econômico assustadoramente real, no qual há uma grande pressão para se destruir identidades nacionais em nome de uma ditadura corporativa que só se importa em lucrar. Assim, A Lucidez da Lenda acaba se distanciando do comum em distopias...

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A NARRATIVA E OS PERSONAGENS

A Lucidez da Lenda se dedica mais a descrever as minúcias do sistema capitalista de controle do poder, mostrando como os ricos e influentes manipulam o resto do mundo para atingir os seus objetivos. Violência, espionagem, traição, chantagem, massacre: tudo vale na hora de deixar os ricos mais ricos e os pobres mais obedientes. Apesar de, assim, fazer uma crítica interessante a esse sistema, Taunay acabou deixando a história um pouco entediante, pelo menos para quem não esperava inúmeras cenas de delineamento de planos empresariais de dominação mundial em salas de reunião. Somado a isso, a narrativa do autor, em terceira pessoa, também contribuiu para que a minha leitura fosse bastante lenta. O texto é exaustivamente descritivo, com frases muito longas para descrever tanto o cenário, as ações dos personagens e, ainda, os seus pensamentos e sentimentos. Como gosto de narrativas mais objetivas, acabei lendo muito poucos capítulos de A Lucidez da Lenda por vez, mesmo eles sendo curtos. 

O maior problema, talvez, que tive com A Lucidez da Lenda foi não conseguir me conectar com os personagens. O autor investiu em personalidades muito estereotipadas de vilões e mocinhos, e como eu não vejo o mundo de forma dicotômica, com os bons de um lado e os maus de outro, não me apeguei a nenhuma delas. Me incomodou, em especial, a representação das mulheres em A Lucidez da Lenda. Apesar de investir em uma protagonista feminina, a obra deixa a desejar com uma visão sexista de mulheres, dividindo-as em santas virgens como a Antônia, ou manipuladoras sensuais e sem moral, como a mulher de Smartt, um dos empregados mais leais de Gorila. Nesse ponto, preciso comentar também que o autor me irritou pela forma como sempre descreve o corpo das mulheres (todas bonitas e desejáveis, é claro, mesmo a santa Antônia), mas não faz o mesmo com homens.

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A EDIÇÃO 

A Lucidez da Lenda traz uma excelente edição, com um texto sem erro e boa diagramação. Um detalhe que gostei foi a sombra de arranha-céus no início de cada capítulo. O tipo e tamanho da fonte também é bom, e, como sempre, fico feliz que o livro tenha páginas cor de creme em vez de brancas. Eu gosto muito da capa de A Lucidez da Lenda. Ela é bonita e combina não só com o ar tecnológico e futurista da distopia, como representa bem a história trazendo a silhueta de uma garota em frente aos prédios, ou seja, Antônia em sua luta contra o mundo corporativo.

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CONCLUSÕES FINAIS

A Lucidez da Lenda se provou uma leitura interessante, que traz críticas e reflexões únicas, mas não muitas emoções. Os personagens pouco cativam e são estereotipados, e a narrativa cansativa. A obra se distingue por trazer um cenário nacional belo e rico, além de elementos da cultura brasileira, para a trama. A Lucidez da Lenda também se destaca por delinear um futuro assustadoramente real, com tecnologias bem próximas da que já temos, assim como um cenário sociopolítico-econômico bem crível. O livro é o que eu chamaria de uma distopia corporativa, que nos leva a entender certas minúcias do mundo empresarial e o modo como o capitalismo se utiliza do poder e do dinheiro para controlar a sociedade e gerar mais poder e dinheiro para quem já os têm. Não é das leituras mais fáceis, mas A Lucidez da Lenda pode agradar quem não se incomoda com leituras densas e minuciosas sobre o assunto.

QUOTES FAVORITOS

“Estranhos mistérios costumavam virar do avesso as fronteiras do convívio entre vivos e mortos no interior da floresta, onde a umidade do ar penetra o emaranhado das copas luxuriantes e cobre parte do céu despejado, trazendo uma atmosfera respeitosa a prenunciar mais um dia de luz na região do Alto Amazonas.” pág. 16

“- As estrelas indicam o caminho, mas não nos obrigam a segui-lo.” pág. 229

Título: A Lucidez da Lenda
Subtítulo: Um ensaio sobre o futuro
Autor: Raul de Taunay
Editora: Pandorga
ISBN: 9788584422876
Ano: 2018
Páginas: 408
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1 comentários:

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