A HISTÓRIA
Inverno de 1845. Frances Osgood é uma poeta de sucesso moderado, mas conhecida e adorara no exclusivo círculo de intelectuais da Nova Iorque de seu tempo. Seu talento com as palavras, mente sagaz, maneiras gentis e beleza delicada conquistaram muitos homens e mulheres do mundo literário, mas, curiosamente não foram o suficiente para manter seu marido, um pintor mulherengo, por perto. Assim, morando com as duas filhas pequenas na casa de amigos, sem qualquer ideia de onde o marido está, Frances apenas sonha em conseguir sustentar-se somente com seus escritos.
Entretanto, histórias infantis e poemas sobre flores como os que Frances escreve não estão na moda. O mundo literário e toda Nova Iorque está fervendo por algo diferente: histórias sombrias e assustadoras, com seus mistérios, muito sangue e assassinos assombrados por suas vítimas. E tudo isso por causa de um homem de origem humildade e personalidade esquiva: o sr. Edgar Allan Poe. O homem é um mistério, um crítico literário com muitos inimigos, mas suas palavras são como drogas, todos sempre querem mais e mais, especialmente depois da publicação de seu poema O Corvo.
Frances Osgood não entende a obsessão de todos com esse tal de Poe. Ela não acha O Corvo tão impressionante assim e não gosta de histórias sombrias e temas sobrenaturais. Mas logo Frances entende o fascínio de todos, especialmente das mulheres, quando conhece Poe pessoalmente. Ele é tão misterioso quanto dizem, mas se revela um homem inteligente e, algo que ela jamais imaginaria, sensível. Há um magnetismo em Poe que nem mesmo Frances consegue ignorar. Ele é sombrio e parece danificado, mais do que isso, perigoso, mas a mulher não consegue resistir.
A atração entre eles é imediata. Poe também fica obcecado com a bela e delicada Frances e não se esforça para esconder isso de ninguém, aparentemente, nem de sua própria esposa. E a Sra. Poe é uma coisa e um mistério a parte. Ela é ainda mais sombria que o marido, entretanto, bem mais jovem do que ele e sem qualquer tato social, além de bastante doente. Frances fica intrigada com a Sra. Poe também, tão frágil, mas, ao mesmo tempo, tão ameaçadora, intrusiva e possessiva.
“- A loucura – disse tranquilamente – é como uma gota de tinta na água. A pessoa afetada pela loucura espalha suas garras maliciosas até todos ao redor ficarem matizados de negro. Logo já não é possível saber quem é louco e quem não é.” Pág. 293
Entre conversas intensas, visitas e passeios estranhos, até mesmo troca de poemas, o relacionamento entre Poe e Frances fica cada vez mais intenso e o flerte inocente deles ameaça virar um romance proibido. Contudo, além das questões morais que a atormentam, Frances sempre sente a sombra feroz da Sra. Poe pairando sobre ela. Frances ama tanto Edgar que sente que morreria sem ele, mas, será que se entregar para o seu amor não custará sua reputação, sua sanidade e, talvez, a sua vida?
A LEITURA, AMBIENTAÇÃO E CRÍTICA DO LIVRO
Eu fiquei curiosa por Sra. Poe assim que coloquei olhos no livro pela primeira vez. Eu amo romances de época e históricos e fiquei intrigada por conhecer o mundo literário novaiorquino do século dezenove, assim como um pouco da vida de Edgar Allan Poe. E Sra. Poe acabou sendo ainda melhor do que eu esperava. Com uma narrativa em primeira pessoa pela perspectiva de Frances, a autora consegue nos envolver profundamente em sua trama sedutora e sombria. A escrita de Lynn Cullen é muito boa e flui com rapidez impressionante. Apesar de não ter lido o livro tão depressa, eu fiquei fissurada na história enquanto a lia e, mesmo alguns dias depois de terminá-la, não conseguia tirar Sra. Poe da cabeça.
Sendo baseado, em sua grande maioria, em fatos reais (apesar que suspeita-se que o relacionamento de Poe e Frances nunca tenha passado de um flerte), Sra. Poe pouco surpreende. Eu gostaria que a autora tivesse ousado um pouco mais, contudo, apesar da falta de acontecimentos inesperados, a obra acaba sendo uma leitura intensa e emocionante, assim como sombria e convincente. Mesmo tendo previsto grande parte e já saber, graças a pesquisas que fiz antes de começar o livro, qual o destino dos personagens, a história de Sra. Poe soa completamente real (como se fosse realmente a Frances quem escreveu o livro) e muito impressionante.
Eu amei como a autora deu espaço, em meio ao romance, para um retrato interessante de Nova Iorque da época. Em vários trechos Lynn Cullen aborda a grande expansão que a cidade estava presenciando e o contraste já existente desde o século dezenove, com ricos convivendo lado a lado com os pobres, em especial imigrantes, mas ignorando a sua existência.
Eu amei como a autora deu espaço, em meio ao romance, para um retrato interessante de Nova Iorque da época. Em vários trechos Lynn Cullen aborda a grande expansão que a cidade estava presenciando e o contraste já existente desde o século dezenove, com ricos convivendo lado a lado com os pobres, em especial imigrantes, mas ignorando a sua existência.
“ - (…) Eu a admiro [Frances] por criar as suas duas filhas sozinha e pelo seu trabalho. Não arruíne sua reputação de escritora séria por causa de um homem. A história sempre dá um jeito de esquecer as amantes dos grandes homens. Mesmo quando elas possuem talento.” Pág. 246
Algo pelo qual elogio a autora também, foi por dar grande destaque as personalidades femininas da época. Em Sra. Poe, vemos mulheres artistas já muito ativas e, algumas, até mesmo bastante independentes. Frances era uma poeta de sucesso moderado e a Sra. Poe apenas uma dona de casa, mas o livro nos faz perceber que sem as duas, talvez Edgar Allan Poe não teria se tornado quem se tornou.
E Lynn Cullen ainda fala de muitas outras mulheres essenciais para o círculo intelectual da época. Entusiastas das artes, poetisas, escritoras, musicistas, jornalistas, editoras e muitas outras que, infelizmente, foram completamente esquecidas pelo tempo, enquanto muitos dos homens de sua época forma eternizados. A autora destaca bem o machismo da sociedade da época: através de Frances, vemos como era muito mais difícil para uma mulher alcançar o sucesso por si só, ela mesmo só começou a ser conhecida pelo público geral quando os boatos de seu caso com Poe se espalharam...
E Lynn Cullen ainda fala de muitas outras mulheres essenciais para o círculo intelectual da época. Entusiastas das artes, poetisas, escritoras, musicistas, jornalistas, editoras e muitas outras que, infelizmente, foram completamente esquecidas pelo tempo, enquanto muitos dos homens de sua época forma eternizados. A autora destaca bem o machismo da sociedade da época: através de Frances, vemos como era muito mais difícil para uma mulher alcançar o sucesso por si só, ela mesmo só começou a ser conhecida pelo público geral quando os boatos de seu caso com Poe se espalharam...
OS PERSONAGENS
Quanto aos personagens, as figuras femininas se destacam, mas todos foram bem desenvolvidos e tem seu papel na história. Começando pela protagonista, eu adorei Frances desde o início. Ela é uma mãe dedicada, uma amiga fiel e uma mulher gentil, mas também inteligente e crítica, claramente a frente de seu tempo e, infelizmente, muito sofrida. É impossível não se compadecer com a personagem e revoltar-se junto com ela pelo machismo e limitações de seu tempo. Também me identifiquei bastante com Frances e seu desejo de ser uma escritora reconhecida, assim como sua dificuldade de produzir algo que agradasse o público geral, mas que não conversava com sua alma. Contudo, mesmo adorando a protagonista, me irritei com seus escolhas e senti que Frances, em vez de desenvolver, deu passos para trás.
O problema do relacionamento entre Frances e Poe é que eu não gostei de Poe. A princípio, eu me senti envolvida pelo caráter misterioso de Poe, mas logo ele passou a soar arrogante, invejoso e insensível, um homem que vive das próprias vontades e que se acha superior aos demais. A forma com que tratava a esposa é revoltante, mesmo ela não sendo as melhores das pessoas, e também não gostei do modo como ele tratava Frances, brincando com sua mente e sentimentos. E por achar Poe um cara, perdoem a palavra, bem escroto, eu senti que Frances regrediu quando se envolveu com ele, se tornando uma mulher dependente emocionalmente dele e infiel a sua própria moral e pessoa.
O relacionamento de Frances e Poe começa com uma paixão gostosa, mas logo se torna um romance deturbado e sombrio. Apesar de ter sido fascinante acompanhar essa história na ficção, o livro me deixou inquieta por dias e realmente desejo que, na realidade, Frances e Poe não tenham se envolvido tão a fundo, pois, afinal, não consigo mais ver o Edgar com bons olhos.
“- Palavras, palavras, palavras, palavras. Eddie não é um homem de verdade. Ele é apenas uma concha feita de palavras. Não se apaixone por um poeta, sra. Osgood. Eles só amam as suas palavras.” Pág. 271
Outra personagem com a qual não consegui simpatizar foi a Sra. Poe, que me provocou uma mistura de pena e medo. Por um lado, ela não passa de uma criança que foi sugada para dentro de um relacionamento inadequado com um homem sombrio. Por outro, Virginia Poe é mulher de saúde frágil, cuja sombra de uma morte prematura a torna mais sombria até que o próprio Edgar. Mas, a Sra. Poe também é uma mulher gananciosa, possessiva e venenosa, talvez capaz das maiores loucuras para conseguir o que quer.
O relacionamento de Edgar e Virginia é intrigante e chochante, afinal, eles eram primos e se casaram quando ela tinha 13 e ele 26 anos. E Sra. Poe também questiona algo interessante: grande parte das histórias de Poe envolvem homens atormentados pela morte das mulheres que amavam, então o que seria de Poe se ele mesmo não tivesse se casado com uma garota a beira da morte? Lynn Cullen mostra como Virginia foi essencial para a obra do marido, não só como inspiração, mas como admiradora e incentivadora das histórias de Edgar.
A EDIÇÃO
A tradução do livro está perfeita. A diagramação é simples, mas as páginas amareladas ajudam a deixar a leitura mais leve, apesar de que gostaria que as letras fossem um pouco maiores. A capa de Sra. Poe é maravilhosa e combina perfeitamente com o ar sombrio e antigo da obra.
CONCLUSÕES FINAIS
Sra. Poe em duas palavras? Intrigante e sombrio. O livro traz a história de um amor proibido e conturbado, cercado de sedução, inveja e medo. Uma obra para se conhecer melhor a sociedade literária novaiorquina do século dezenove, Sra. Poe também nos proporciona um olhar único sobre o famoso e obscuro Edgar Allan Poe através de seu amor distorcido por sua jovem mulher doente e sua paixão avassaladora por Frances Osgood.
Uma obra envolvente e intrigante, Sra. Poe superou as minhas expectativas e proporcionou uma leitura inquietante, mas fascinante e inesquecível. Eu amei o livro, fazia tempo que não lia um romance histórico baseado em fatos e personalidades reais, e Sra. Poe não decepcionou. Mais que recomendado para os fãs de Poe ou para quem quer conhecer mais sobre esse escritor tão misterioso. Uma obra emocionante e envolvente, que me deixou curiosa para ler mais obras da autora.
QUOTES FAVORITOS
“Ele [Poe] desviou o olhar sinistro para ela. Quase estremeci com a dor e fúria contida em seus olhos de cílios escuros. O que acontecera com aquele homem para transformá-lo naquela fera ferida?” Pág. 40/41
“- Sempre que vir tanta riqueza, pressuponha que alguém sujou as mãos. Santos não constroem fortunas.” Pág. 54
“Apenas me permitira um tipo de comunicação entre nós [Frances e Poe]: poemas. (…) Sim, eram apenas palavras, mas sou uma poeta e palavras são minha moeda corrente.” Pág. 242
“Importava-me com que as pessoas pensavam. Eu me importava com o fato de não ser a sra. Poe, mas sim a amante do sr. Poe. Eu me importava que minha poesia fosse apreciada tão somente por causa da minha relação com o sr. Poe.” Pág. 327
“Eu havia sido uma escritora, antes que o meu amor pelo sr. Poe me consumisse.” Pág. 355
Título original: Mrs. Poe
Autora: Lynn Cullen
Editora: Bertrand Brasil
ISBN: 9788528618457
Ano: 2016
Páginas: 400
*Esse livro foi uma cortesia da Editora
Compre: Amazon- Submarino - Americanas
Já notei que vc gosta de romance de época.
ResponderExcluirÉ interessante... conseguimos enxergar o mundo de uma maneira diferente, por assim dizer. Pruncipamente por ser baseado em fatos reais... Fica tudo mais verdadeiro.
Parece ser uma leitura interessante.
Sua resenha ficou ótima 😙
Todos estão falando desse livro e como nunca li nada do Poe, mas tenho vontade pensei como seria bom conhecer um pouco sobre alguém tão próximo a ele. Estou curiosa para ter e ler esse livro. Bom demais conferir sua opinião tão detalhada sobre o livro. Foi a primeira que li dele e adorei, parabéns viu!!
ResponderExcluirGostei de saber que a autora apresenta bem a sociedade da época e toda transformação que ela vivenciou. Além do destaque para as mulheres apesar do machismo.
Curiosidade: O nome do meu esposo é Frances =P
Como sempre suas fotos e texto são maravilhosos e me inspiram.
Beijos linda e saudades.
Sumi pq estou meio na correria, mas nunca te esqueço viu!!???
Leituras, vida e paixões!!!
Oi, Ana!
ResponderExcluirApesar de todos os seus elogios, não me vejo interessada na obra. Algo não me cativou.
Beijos
Balaio de Babados
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Oi Ana!
ResponderExcluirQue resenha fantástica! Super completa, adorei! Já estava com vontade de ler esse livro, porque adoro um histórico, agora estou mais ainda!
Parabéns pelo resenha e pelas fotos!
Bjs, Mi
O que tem na nossa estante
Oi, Ana. Mesmo amando os romances de época, sei que teria muita dificuldade em procurar um livro assim para ler. Na melhor das hipóteses, eu iria achar o livro maçante. Mas que bom que gostou, acredito que isso possa influenciar algumas pessoas a lerem também.
ResponderExcluirBeijo, Visite o Leitora Encantada
A resenha, como sempre, está ótima, mas infelizmente não me interessei por esse livro. Mesmo sendo louca por romances de época a história não parece que vai conseguir pender minha atenção.
ResponderExcluirBeijos
no-universo-dos-livros.blogspot.com
Não sou muito fã desses livros de "romance histórico", mas leria esse, pois essa resenha foi muito boa e apesar de ser um livro de romance, ele é interessante e aparenta ser muito legal.
ResponderExcluirSua crítica é excelente. Como tradutora do livro, agradeço pelo elogio "A tradução do livro está perfeita". Gostaria de fazer uma sugestão: coloque sempre o nome dos tradutores, Ana Luiza. Como você deve saber, nosso trabalho é muito importante, embora nem sempre reconhecido. Afinal, somos nós que damos voz/palavras ao texto original. Sucesso sempre!
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