4.8.14

Resenha: O Senhor das Moscas - William Golding




Título: O Senhor das Moscas
Título original: Lord of the Flies
Autor: William Golding
Editora: Nova Fronteira
ISBN: 85-209-1843-3
Ano: 2006
Páginas: 220
Classificação: 5/5 [ótimo] - favorito
Sinopse: Um grupo de jovens é retirado de uma cidade atingida por um bombardeio atômico. Eles passam a viver numa ilha deserta do Pacífico e lá reconstituem os valores da sociedade em que viveram. Este romance é considerado a obra-prima do prêmio Nobel de 1983.


Agora contemplem os Senhores das Moscas

Um avião que transportava um grupo de crianças para longe da Guerra cai em uma ilha e os pequeninos são os únicos que sobrevivem. Sem supervisão de adultos, eles se espalham pelo terreno desconhecido, mas são reunidos novamente graças ao soar de uma concha. Ralph é um garoto extremamente ativo, curioso e dócil que por ter sido aquele que os reunira com o barulho da Concha, é eleito o líder, o que desagrada Jack profundamente.

Líder de um coral de meninos, Jack está acostumado a liderança e ao poder, e quando perde a votação para Chefe, ele estabelece que seria, juntamente com seus antigo coral, os caçadores do grupo. Ao lado de Porquinho, um gordinho extremamente inteligente e racional, Ralph logo estabelece seu governo simples, mas com objetivos claros, entre eles principalmente: construir e manter uma fogueira para chamar a atenção de um possível navio que passasse por perto, construir cabanas e manter todos vivos até que alguém os resgatasse.
“- Quando você está caçando, às vezes você se sente como se... – Corou subitamente. – Claro, não é nada de mais. Só um sentimento. Mas você sente como se não estivesse caçando, mas... sendo caçado. Como se houvesse alguma coisa atrás de você o tempo todo na floresta.” Pág. 60
Enquanto Porquinho e Ralph estão certo de que serão resgatados, Jack parece mais cético e nem um pouco contente como as coisas estão andando. Logo fica claro que nem um dos garotos, especialmente os mais novos, abraçam muito as responsabilidades, eles preferem divertir-se pela ilha enquanto Ralph, Porquinho, Jack e alguns outros poucos fazem todo o trabalho duro.

Apesar da liderança de Ralph, a vida na ilha beira ao caos, pois de nada adianta regras e deveres estabelecidos se ninguém os obedece. As coisas não saiam como imaginavam, planos eram dificilmente concluídos, limites estabelecidos não eram muito respeitados e o medo de não serem resgatados era substituído pelo medo de se viver na ilha. Boatos sobre um “Bicho” misterioso e assustador assombra as crianças, mas o que elas não sabem é que o perigo reside nelas mesmas e em seus companheiros. 
“- Porque as regras são a única coisa que temos!
(...)
- Que as regras vão pro inferno! Somos fortes, nós o caçamos! Se houver um bicho, nós os caçaremos! Vamos cercá-lo e bater, bater, bater!...” Pág. 101
Cada vez mais os meninos perdem o senso de comunidade para ganhar um ar de tribo ou bando. A vida rude da ilha parece provocar nos garotos o despertar de seus instintos e comportamentos mais primitivos. O único poder que realmente existe na ilha é o Chefe, Ralph, e mesmo que suas determinações e regras não sejam seguidas a risca, sua figura é extremamente respeitada e até mesmo venerada, posição que Jack profundamente deseja. Entretanto, a liderança de Ralph fica cada vez mais enfraquecida com a passagem do tempo conforme a popularidade de Jack aumenta. Enquanto o primeiro, aos olhos do grupo, é o líder chato que os enchem de responsabilidades e tarefas, Jack é aquele que traz carne e diversão para suas vidas. Ralph pode atender a todas as suas necessidades, mas Jack atende aos desejos e em uma disputa entre os dois será inevitável. 
“A pilha de entranhas era uma bolha negra de moscas que zumbiam como uma serra. Depois, as moscas descobriram Simon. Fartas, pousaram às margens dos riachos de suor e beberam. Fizeram cócegas sob as narinas e brincaram de pular sela nas suas coxas. Eram inúmeras, pretas e verdes iridescentes. Diante Simon, o Senhor das Moscas estava pendurado na vara e sorria. Enfim, Simon desistiu e olhou; viu os dentes brancos e os olhos opacos, o sangue – e seu olhar esgazeado prendeu-se àquele reconhecimento antigo e irrecusável.” Pág. 151
Andando pela biblioteca encontrei esse livro. O título me chamou muita atenção, além de naturalmente impactante, ele me recordou um verso (aquele do título) de uma música do Ghost, uma das minhas bandas favoritas. Peguei O Senhor das Moscas e comecei a lê-lo sem fazer a mínima ideia sobre o que se tratava. Confesso que nas primeiras páginas fiquei entediada. A saga de um bando de crianças presas em uma ilha não me conquistou logo de início, especialmente porque não gosto muito de histórias de náufragos desde que fui obrigada a ler Robinson Crusoé na escola e que já vi o filme Náufrago umas dez milhões de vezes na Sessão da Tarde.

Entretanto, conforme a trama avançava e ganhava ainda mais tensão, finalmente percebi que O Senhor das Moscas não se tratava apenas de uma história sobre crianças presas em uma ilha. O livro, na verdade, mostra o regresso humano a animalização, ao modo de vida primitiva. A história dessas crianças nada mais é do que uma mostra de como somos influenciados pelo meio, de como guardamos instintos e comportamentos selvagens, que podem ser despertados a qualquer momento. 

O autor explora, de forma genial, a fragilidade da índole humana e do nosso senso de civilização. É muito fácil, para qualquer um de nós, em nossas casinhas dentro da cidade, inseridos em uma sociedade extremamente complexa, pensar em nós mesmos como seres evoluídos, dotados de inteligência superior e de humanidade. Tratamos uns aos outros com relativo respeito, seguimos regras, cumprimos nossos deveres e temos até mesmo tempo para sermos um pouco altruístas, pensar e ajudar os outros. Entretanto, basta um passo para fora dessa vida, alguns dias isolados longe do que conhecemos por mundo, que nos transformamos completamente, passamos a viver bem, como animais, reunindo-nos a outros apenas para ganhar alguma coisa (seja proteção, alimento, etc.) e atacamos uns aos outros sem qualquer receio ou culpa. 
“- O que é melhor? Ser um bando de índios pintados como vocês ou ser razoável como Ralph? (...) Que é melhor? Ter regras e segui-las ou caçar e matar? (...) O que é melhor? A lei e o salvamento, ou caçar e destruir?” Pág. 197
Podemos até pensar: “Ah, isso nunca vai acontecer. Qual a chance acabarmos isolados em uma ilha ou sei lá mais onde?”. Bem, as chances são mesmo poucas. Mas a genialidade de William Golding se encontra aí. Ele nos faz pensar como reagiríamos na mesma situação dos seus protagonistas, mas também se é só naquela situação que nosso pior lado, nosso lado mais selvagem, pode se manifestar. Ficar naquela ilha transformou dóceis e obedientes crianças em selvagens pintados armados com lanças. Entretanto, foi realmente o náufrago que os deixou assim? Ou foram pequenas coisas que se seguiram? O que nos separa da civilidade e da selvageria? Da ordem e do caos? Da sanidade e da loucura? Esses são só alguns dos questionamentos que o livro levanta, além de mostrar que linhas tênues podem dividir todas essas coisas.


Com uma trama aparente simples, mas bem desenvolvida e cheia de significados, Golding construiu uma história rica e extremamente filosófica. Sua narrativa já não me agradou muito, tive muita dificuldade para visualizar os cenários que ele descrevia e confesso que só com ajuda de imagens da internet (como essa acima) foi que consegui realmente ver a geografia da ilha. Por outro lado, seus personagens ganharam um espaço no meu coração: desde o injustiçado Porquinho, ao genuíno e doce Ralph e o ambicioso e maléfico Jack, até mesmo os personagens secundários. Mas, aquele que mais amei foi O Senhor das Moscas, que belamente ilustra tudo o que há de ruim a ser despertado dentro de nós.
“Começou o canto e um movimento de cerco. Enquanto Roger imitava o terror do porco, os pequenos corriam e saltavam fora do círculo. Porquinho e Ralph, sob ameaça do céu, sentiam-se ansiosos para tomar parte nessa sociedade demente, mas parcialmente segura. Gostariam de tocar os ombros bronzeados no círculo, que encerrava o terror e o domava. Matem o bicho! Cortem a garganta! Tirem o sangue!” Pág. 166
Quando a edição, tenho apenas uma reclamação. Gosto muito da capa, que é simples, mas ilustra bem o ar e alguns aspectos da obra. A tradução e diagramação estavam perfeitas. As páginas amareladas ajudaram a deixar a leitura bem mais rápida, e gostei da fonte das letras, apesar de que elas podiam ser um pouco maiores. A única coisa que me desagradou foi o livro não ter orelhas, coisa que odeio.

O Senhor das Moscas é um clássico de tirar o fôlego e de alto teor filosófico que entrou para a minha lista de favoritos. Amei a obra, que foi uma excelente surpresa e que me deixou bastante curiosa por outros livros do autor. 
“Ajoelhou-se entre as sombras e sentiu amargamente seu isolamento. Eles eram selvagens, é verdade; mas eram humanos e os medos emboscados na noite profunda estavam se aproximando.” Pág. 204

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15 comentários:

  1. pequenos, mas de quantos anos estamos falando?? eles parece ser muito inteligentes mesmo, e não tão jovens assim...
    confesso que não conhecia o livro, mas fiquei bem curiosa por ele! a história paree ser incrível! :O
    livros sem orelhas também não me agradam muito, e esta capa ai me deixou um pouco desanimada... achei simples demais ;x

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    1. Kk os mais velhos tem, no máximo, doze anos. Mas o autor consegue equilibrar os momentos onde eles são infantis e onde não. O livro é muito bom, leia mesmo! Eu gosto dessa capa, mas a falta de orelhas é mesmo ruim...

      Bjs

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  2. Oi Ana, não é um livro que leria no momento, não me atraiu e ando lendo muito pouco, fase ruim :(
    Parabéns pela resenha, a Nanda colunista do Daily vai adorar está dica, ela adora clássicos..

    Beijos Mila
    http://www.dailyofbooks.blogspot.com.br/

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    1. Oi Mila!

      Uma pena que o livro não te atraiu e que você está passando por uma fase ruim, espero que isso mude, que tudo melhor e você volte a ler como antes! E, ah, não deixe de recomendar para a Nanda!

      Beijinhos!

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  3. Oi Ana!
    Esse livro parece ser ótimo! É um clássico que faz tempo que quero ler.

    Beijos,
    Sora - Meu Jardim de Livros

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  4. esse livro é muito bom, um dos meus preferidos.
    Adoro a forma como as crianças retornam ao 'primitivo', o autor aborda bem essa questão do indivíduo perder a civilidade e aderir a selvageria quando não se há regras [e no caso da história. adultos] a seguir...
    O ser humano mostrando sua faceta verdadeira por baixo da máscara de civilidade...
    Gostei de Porquinho, mas tenho muita pena dele :(
    bjs, flor. Esse livro eu indico pra todo mundo rsrs

    http://torporniilista.blogspot.com.br/

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    1. Rs esse livro é mesmo muuuuuito bom! Meu favorito foi o Jack, sempre gosto dos antagonistas e achei legal ele, diferente do Porquinho e do Ralph, aceitar o lado mais "animal" de todos!

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  5. Achei a história incrível. De uma criatividade fora de série. rsrsrs Nem conhecia o livro, pode acreditar? Mais agora... Vou ter que ler. Fiquei muito curiosa com seus comentários sobre o livro. Essas crianças são prodígios. Muito bom mesmo. Beijos.

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  6. muitooo interessante o livro procurarei pra ler

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  7. Interessante, não conheço o livro, mas quero conheçer!!
    beijos

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  8. Preciso muito ler esse clássico.
    Acho a história sensacional, adoro assim violenta, animalesca, e que nos faz refletir sobre vários aspectos humanos.
    Que bom você teve o prazer dessa leitura e ter gostado tanto a ponto de favoritar.
    Pena essa edição não ser mais caprichada.

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  9. Oi Ana, não conhecia o livro e ler sua resenha me fez ver como este livro pode ser uma boa opção de leitura!
    Bjs, Rose

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  10. Nossa que história incrível, muito interessante, não conhecia esse livro, fiquei bastante curiosa, quero muito conferi essa história que parece mesmo ser ótima.

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