9.7.14

Resenha: Garota, Interrompida - Susanna Kaysen

Título: Garota, Interrompida
Título original: Girl, Interrupted
Autora: Susanna Kaysen
Editora: Única
ISBN: 978-85-7312-862-8
Ano: 2013
Páginas: 190
Classificação: 5 /5 [ótimo] - favorito
Sinopse: Quando a realidade torna-se brutal demais para uma garota de 18 anos, ela é hospitalizada. O ano é 1967 e a realidade é brutal para muitas pessoas. Mesmo assim poucas são consideradas loucas e trancadas por se recusarem a seguir padrões e encarar a realidade. Susanna Keysen era uma delas. Sua lucidez e percepção do mundo à sua volta era logo que seus pais, amigos e professores não entendiam. E sua vida transformou-se ao colocar os pés pela primeira vez no hospital psiquiátrico McLean, onde, nos dois anos seguintes, Susanna precisou encontrar um novo foco, uma nova interpretação de mundo, um contato com ela mesma. Corpo e mente, em processo de busca, trancada com outras garotas de sua idade. Garotas marcadas pela sociedade, excluídas, consideradas insanas, doentes e descartadas logo no início da vida adulta. Polly, Georgina, Daisy e Lisa. Estão todas ali. O que é sanidade? Garotas interrompidas.



Bela e brutalmente honesto 

Susanna Keysen não tinha um plano e, para alguns, não tinha um futuro. Susanna não queria ir para a faculdade e não conseguia manter-se em um emprego. Susanna tinha um caso com seu professor de inglês. Susanna espremeu uma espinha e tomou cinquenta aspirinas de uma só vez. Susanna ficou confinada em um hospital psiquiátrico durante dois anos. Susanna é louca? Doente? Uma mistura dos dois ou só uma garota que não sabia o que queria? Uma garota que não atendia nem mesmo suportava os padrões impostos pela sociedade? 
“Seria a insanidade uma simples questão de parar de fingir?” Pág. 52 
Quem é Susanna Keysen e o que ela pode dizer, a partir da sua experiência em um hospital psiquiátrico e de convívio diário com seu transtorno de personalidade, sobre a vida, sobre sanidade e insanidade e muito mais? O livro Garota, Interrompida é a resposta para essa pergunta. A obra autobiográfica, curta e intensa é uma viagem à vida e a cabeça de Susanna, mas também ao universo de garotas que, como ela, tiveram, quando muito jovens, suas vidas “interrompidas”, nem que por um breve instante, por causa do comportamento ou personalidade que tinham, algo que ia muito além de seu controle, mas que eram fatores na hora de defini-las como loucas ou não, como doentes ou não – e olha que nem sempre sanidade ou doença eram tratados como coisas diferentes. 

Apesar de ser uma leitura rápida por causa da pequena extensão, Garota, Interrompida, com sua honestidade brutal e conteúdo denso, foi um livro que me fez sentir vulnerável. Essa é uma história de tanta intensidade e sensibilidade que o leitor fica emocionado e impressionado por a autora ter divido memórias tão particulares e profundas com o mundo. É impossível deixar se identificar com a personagem-autora. Susanna não deixa de frisar que, apesar dos problemas e até mesmo doenças que ela e as outras garotas do hospital tinham, todas eram garotas, pessoas como quaisquer outras. O que faz o leitor se perguntar: e se fosse eu? Será que podia ser eu? Todos nós temos essa impressão de que loucura e doença só afetam aqueles distantes de nós, um parente de um conhecido, um estranho com o qual esbarramos na rua, mas nunca aqueles que estão ao nosso lado, nunca com nós mesmos. Mas a realidade não é assim. Poderia não ser Susanna ou Polly ou Lisa ou Daisy ou Georgina naquele hospital. Poderia ser sua avó, sua mãe, sua prima, sua irmã. Poderia ser você. Garota, Interrompida traz muitos questionamentos, mas, para mim, os mais importantes foram justamente esses. O que impede alguém de estar aqui hoje e amanhã em um hospital psiquiátrico? O que impede uma pessoa aparentemente normal e saudável de ser louca e doente? O que é loucura e doença? Há diferença entre as duas? 
“Se eu, que antes era repulsiva, agora estou assim tão longe da minha loucura, quão longe não estarão vocês, que nunca foram repulsivos, e que profundezas não terá alcançado a sua repulsa?” Pág. 144 
Garota, Interrompida é narrado em primeira pessoa por Susanna, que com sua escrita objetiva e provocativa atinge e conquista o leitor logo nas primeiras palavras. O livro é dividido em capítulos muito curtos, que passam a impressão de que a obra foi sendo escrita conforme a autora se lembrava daqueles fatos. Também foram acrescentados entre os capítulos diversos documentos relativos a passagem de Keysen pelo hospital psiquiátrico, como o Guia de internação preenchido quando ela foi internada, uma forma acrescentar ainda mais realidade e impacto a história. 

Garota interrompida em sua música, Johannes Vermeer, obra que inspirou o título do livro.

Mas se Garota, Interrompida é real, temos de lembrar também que é tendencioso. É Susanna quem conta toda a história, portanto, ela está limitada a visão que a autora teve dos fatos. Uma das provas disso é a consulta que ela teve com o médico que a encaminhou para o hospital. Para Susanna, a consulta não durou mais de meia hora, mas o médico afirma que ele conversou com ela durante três horas. Assim, cabe ao leitor decidir se vai acreditar em tudo ou não, o que deixa o livro ainda mais delicioso. O livro não é contatado sobre uma ordem cronológica específica, o que nos desafia ainda mais na tarefa que é desvendar Susanna através de seu livro. No início, a impressão que a autora passa é de que ela foi internada por causa de nada, que ela era completamente normal e que havia conspiração no mundo que determinou que ela era louca. Mas conforme o desenrolar dos capítulos vemos que não é bem assim. Susanna tinha um problema, uma doença. Mas isso necessariamente define sua insanidade? Só lendo para saber. 
“Minha internação foi voluntária. Tinha de ser, pois eu era maior de idade. Era isso ou um mandado judicial – se bem que, no meu caso, nunca teriam conseguido um mandado judicial (...). Eu não era uma ameaça para a sociedade. Seria uma ameaça para mim mesma?” Pág. 49 
Se Susanna já é um mistério a parte, os personagens secundários também o são. Como os fatos, eles são construídos pela visão de Susanna, o que praticamente desafia o leitor a desvendá-los por si só, a vê-los além da visão que nos é proporcionada pela autora. As garotas com quem Susanna convive no hospital são as minhas favoritas. Cada uma delas tem um diagnóstico e uma personalidade diferente, é impossível não simpatizar com suas histórias igualmente tristes e tocantes como a da autora. Lisa é a que mais desperta curiosidade, talvez por nem mesmo a autora ter conseguido desvendá-la por completo. E toda vez que a Lisa aparecia não pude deixar de lembrar do filme feito a partir do livro e da bela atuação de Angelina Jolie
“Cynthia era depressiva; Polly e Georgina eram esquizofrênicas, eu tinha transtorno de personalidade. Quando recebi meu diagnóstico, ele não me pareceu grave, mas, com o tempo, acabou soando mais agourento que o das outras. Passei a achar que minha personalidade era como um prato ou uma camisa com defeito de fabricação e, consequentemente, inútil.” Pág. 72 
Enquanto Jolie transmitiu a essência Lisa de forma fiel, o mesmo não se pode falar sobre outros aspectos do filme Garota, Interrompida. Apesar das atrizes escolhidas, principalmente a que fez Susanna, serem idênticas as personagens na minha imaginação e terem conseguido fazer um belíssimo trabalho no longa, ele é diferente do livro e um pouco inferior. O filme tem muitos acontecimentos que não estão no livro e que não acrescentam nada a história a não ser um pouco mais de ação e movimento, mas o que mais se perdeu na adaptação foi a sensação causada pela falta de cronologia. No filme, a história é contada de forma cronológica, o que a deixa um pouco sem brilho. Outro detalhe que me incomoda no filme é que Susanna foi retratada de tal forma que não fica claro que ela realmente tem uma doença, o que não acontece no livro. Entretanto, o filme é bom e vale a pena ser assistido, mas apenas depois da leitura do livro. 

Sobre a edição, também tenho só coisas boas a dizer. A tradução e diagramação estavam perfeitas, o tipo e tamanho da fonte também. Como sempre, eu adoro livros com páginas amareladas, mas as de Garota, Interrompida conquistaram ainda mais por serem feitas de um papel mais grosso, resiste. Eu absolutamente amo essa capa. O tom de rosa bem forte é lindo e combina com a história, e um detalhe que amo são as palavras escritas no fundo quase que invisíveis (foto abaixo). 


Honesto, intenso, questionador e emocionante, Garota, Interrompida foi uma leitura incrível e inesquecível, que entrou para os favoritos. Recomendo o livro para quem gosta de histórias densas, mas rápidas de ler e impossíveis de esquecer. A obra também é muito interessante para quem gosta de temas como insanidade e doenças mentais. Quem, como eu, tem certo apreço pela área da psiquiatria, encontra aqui um prato cheio – e delicioso! 
“As cicatrizes não têm personalidade. Não são como a pele da gente: não mostram a idade ou alguma doença, a palidez ou o bronzeado. Não têm poros, pelos ou rugas. São uma espécie de fronha, que protege e esconde o que houver por baixo. Por isso as criamos. Porque temos algo a esconder.” Pág. 21/22


*Esse livro foi uma cortesia da Editora Única

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14 comentários:

  1. Olá!
    Tô de olho nesse livro pra ler desde do ano passado! Mas pra falar a verdade é a primeira vez que paro para ler uma resenha dele, e como eu imaginava é incrível!
    "Honesto, intenso, questionador e emocionante, “Garota, Interrompida” foi uma leitura incrível e inesquecível, que entrou para os favoritos. Recomendo o livro para quem gosta de histórias densas, mas rápidas de ler e impossíveis de esquecer." .Estava apenas com vontade de ler, a partir dessa frase você me deixou com a necessidade de ler imediatamente.

    Beijos!

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  2. Oi Ana :)

    Fiquei extremamente curioso com o livro depois da sua resenha. Confesso que "Garota Interrompida" não despertava minha atenção a alguns minutos atrás, mas a sua resenha foi tão boa, que já adicionei a lista de desejados. Beijos!

    http://euvivolendo.blogspot.com.br/

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  3. eu vi o filme, e quando descobri que era baseado no livro, fiquei muito a fim de ler e bem feliz quando ele foi lançado. Até agora não tive a chance de ler, mas quando surgir a chance, compro.
    Eu achei a história emocionante, me identifiquei um pouco com cada uma das personagens, em algum momento...
    é de se refletir, e de se pôr no lugar delas...
    bjs
    http://torporniilista.blogspot.com.br/2014/07/uma-eletrizante-historia-de-vampiros.html

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  4. Oi!
    Eu era um tanto obcecada para ver o filme. Imagina como me sinto agora sobre o livro! haha
    Acho muito interessante obras que tratam desses problemas como insanidade. Ou qualquer problema que envolva o psicológico, pois esse tema é sempre ignorado pela sociedade. Acho legal quando são abordados de forma intensa e profunda assim.

    Beijos!
    velha-estante.blogspot.com

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  5. desde que este livro foi lançado eu estou curiosa para ler ele. parece ser incrível, inesquecível mesmo!
    mas ao mesmo tempo parece ser uma história forte, bem densa mesmo... porém eu gosto de trama assim
    não sabia que tinha um filme dele também :O
    vou pesquisar! *-*

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  6. Boom , sempre tive vontade de ler esse livro , mais nunca tinha lido uma resenha sobre ele , e confesso que nao era o tipo de historia que eu esperava , mais que parece ser bem inteeressante mais nao tenho certeza se ainda quero ler -o , e eu nao sabia que tinha o filme ! vou procurar saber maais , !
    beeijos!

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  7. Sempre tive curiosidade em assistir esse filme, mas nunca consegui.
    Parece uma versão feminina do clássico Um Estranho no Ninho.
    Ás vezes não gosto de livros narrados de forma não linear, mas sempre depende da história e como a autora escreve.
    Um dia assisto o filme, e se gostar tento ler o livro, que ao contrário de você, conheço gente que abandonou ele.

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  8. Oiee
    Estou curiosa sobre esse livro,nunca vi o filme,mais especificamente por que eu nem sabia que havia um,mas sem dúvidas vou vê-lo logo que terminar de ler a obra.
    Gostei de toda a intensidade da história e seus personagens,mesmo a leitura nos mostrando tudo pelo olhos de Susanna e como ela acha que as coisas aconteceram.
    Essa é uma daquelas histórias que você consegue se identificar com a personagem,e sentir realmente tudo pelo o que ela passou,e a capa está maravilhosa ♥
    beijos

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  9. Ainda não li esse livro, mas tenho muita vontade ...
    Gosto bastante dessa capa que apesar de ser bem simples, acho muito linda .

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  10. olá, ainda não li o livro mas tenho certeza que tem uma história incrivel...

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  11. Olá!
    Me emocionei muito com o filme,e infelizmente,ainda não li o livro,mais vai ser uma das minhas próximas compras!

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  12. Esse livro é ótimo mesmo, bastante interso, apesar de ser bem diferente diferente do livro, gostei do filme.

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  13. amooooooooooooo esse livro >.<
    tão lindooooooooooooooo
    e perfeito

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  14. Olha, esse livro já havia me chamado atenção só pelo nome, mas não imaginava que se tratava de tal assunto, e que o próprio livro relata era tão comum na época. Quando li sua 1ª resenha me encantei mais ainda por ele, e a cada que leio só confirmo o que sinto. Minha admiração aumentou quando descobri a existência do filme rodado em 1999/2000, logo tratei de pesquisar e em breve o assistirei para ficar mais familiarizada com o livro.
    Ótima resenha.

    Bjsss

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